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O Servo e Serviço do Senhor

por T. Austin-Sparks

Primeiramente publicado na revista "A Witness and A Testimony", em Jan-Fev 1932, Vol. 10-1. Origem: "The Servant and Service of the Lord". (Traduzido por Marcos Betancort Bolanos)

Leitura: Êxodo 21:1-6; Deuteronômio 15:12-17; Levítico 8:14-28; Isaías 50:4-5.

“Eis que estou à porta e bato; se alguém ouvir a minha voz, e abrir a porta, entrarei em sua casa, e com ele cearei, e ele comigo. Ao que vencer, eu lhe concederei que se assente comigo no meu trono. Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas”. (Apocalipse 3:20-22).

O Ouvido do Servo

Observe que a característica comum em todas estas passagens é a do ouvido. Estamos nos ocupando com o assunto dos servos e do serviço do Senhor, e não é pouco impressionante notar como o ouvido na palavra de Deus, tem um lugar tão importante no serviço de Deus. Precisamos, obviamente, sempre obter um pano de fundo adequado para qualquer matéria a ser considerada. É muito fácil fazer uma Leitura Bíblica dos “ouvidos”, ajuntar os “ouvidos” da Bíblia e formar eles num certo arranjo ordenado, mas não é suficiente. Queremos obter a extensão das coisas a partir do ponto de vista Divino, e ver como estas coisas, não são só coisas nelas mesmas, mas elas se encaixam em algo que é tremendo em sua contemplação e aplicação.

Podemos ser ajudados a obter este grande pano de fundo ao lembrarmos que a ruína, destroços, toda a miséria e desgraça, pecado e aflição, dor e sofrimento de todo tipo, tudo o que tem atingido desde nosso redor até ao próprio coração de Deus, tudo que tem sido uma mão contra o Seu trono, tudo que tem ficado no caminho para deter o Seu grande propósito eterno, tudo que necessitou Deus dando o Seu único e muito amado Filho, tudo que fez essencial a Cruz de Cristo, e muito mais, é o resultado direto de um ouvido erroneamente operando; tudo que foi ocasionado pela captura de um ouvido pelo inimigo. O inimigo ao lançar seus planos para capturar a raça e o mundo e o lugar de autoridade para si mesmo, deliberadamente decidiu que o ponto de ataque que serviria a ele melhor, serviria sempre mais seus interesses, seria o ouvido. E por isso ele assaltou o ouvido e fez suas insinuações por meio do ouvido. “É assim que Deus disse...?” E tudo o resto se seguiu. O ouvido foi emprestado à sugestão, à insinuação; o ouvido foi entregue com estas extensas consequências terríveis.

Agora, amado, isso é apenas a metade da história. A outra metade é esta, que na redenção do mundo, na redenção da humanidade, na recapturação para Deus e para o homem do governo do universo, na destituição de todo esse poder e a destruição de todas essas obras, Deus o faz capturando um ouvido. E estas passagens que temos lido nesta noite, em tipo, se relacionam ao ouvido do Senhor Jesus, que Deus tinha Seu ouvido. Foi porque Deus tinha o Seu ouvido como Ele o teve que o resto surgiu.

Observe, você tem um principio tremendo neste serviço e servo do Senhor, o Servo, maior de Quem nunca tem sido um Servo do Senhor, o Senhor Jesus mesmo cumpriu Seu maravilhoso serviço, comissão, a Sua maravilhosa obra, primeiramente por uma rendição do Seu ouvido ao Pai. Era a lei do ouvido em relação a Deus que governou este Servo para começar. Outras coisas se seguiram, como veremos num outro tempo, mas foi aqui onde começou, e embora que no Seu caso é muito mais do que poderia jamais ser no caso de qualquer outro, o principio ainda vale para todos os servos de Deus, que Deus vai realizar o Seu propósito celestial primeiramente mediante um ouvido a Seu cargo, sob o Seu controle, em comunhão com Ele mesmo. E, se eu e você vamos entender a natureza do ministério sacerdotal, temos que chegar a conhecer o que é ter um ouvido segurado por e para Deus. Agora, obviamente, tendo estabelecido o pano de fundo, ou visto a extensão disto em principio, podemos entrar então nas ilustrações disso, e obter o significado destas várias passagens que têm a ver com o ouvido.

Na primeira destas passagens em Êxodo e Deuteronômio, o servo, o escravo é trazido. Notem um ou dois detalhes. Ele é um hebreu. Ele não é um estranho, ele é um membro dessa raça que foi libertada da escravidão e servidão, cujos direitos da aliança eram liberdade, mas dentro da abrangência de um povo liberado ele está em servidão. Ele é um hebreu. Ele é propriedade de um senhor. Ele serve esse senhor por seis anos, e depois o sétimo ano, o ano do jubileu, é o ano da liberação. Este escravo chega ao dia em que seu senhor é compelido a libertar ele e deixar ele ir; ele não pode mais segurar ele quanto à lei diz respeito, e ao escravo lhe é dada a liberdade. O senhor diz a ele, “bem, isso e aquilo, o tempo chegou para você tomar a liberdade que é sua por direito, sair livre, não posso te segurar mais, aí está você”.

O escravo se volta para o seu senhor e diz, “mas existem maiores laços do que o da lei, existem ligações mais poderosas do que o legalismo, existem tais coisas como laços do coração, e são esses laços que me seguram. Já faz bastante tempo que cessei de estar ligado pela lei, tenho me tornado ligado pelo amor e não quero ser libertado disso, não sairei livre, escolho deliberadamente na base de um relacionamento de coração para sempre, não por outros seis anos, não por outro termo da lei, não por doze ou dez e oito anos ou qualquer outro número de termos legais, escolho para sempre por toda a extensão da minha vida, habitar nesta casa e servir”. Essa declaração deve ser formada numa aliança, selada em sangue. O senhor leva ele para o umbral da porta da casa e com uma sovela fura sua orelha e o sangue cai sobre o umbral, e esse umbral torna-se um altar com sangue salpicado nele, e nessa aliança de sangue, o senhor e o servo fazem parte da casa para sempre.

Ora, tudo isso é muito simples, tudo muito bonito, mas observe que isso introduz a verdadeira natureza do servo e o serviço como representado pelo Senhor Jesus. O Senhor Jesus estava sob nenhuma obrigação legal para chegar e cumprir esse serviço, mas Ele o cumpriu. Ele não veio porque Ele foi legalmente compelido ou judicialmente limitado para com isso. Ele não veio num espírito de independência para Ele realizar isto, em que obviamente, Ele o faria se quisesse, mas no entanto, poderia resignar. Não! Ele veio nesta base – por causa do amor, na base do amor. Ele era o escravo de Jeová para levar esta obra em relação à Casa de Deus, e esse serviço e servo foi selado no Seu próprio sangue. O derramamento desse sangue foi o derramamento de Sua vida, o sinal dessa vida e morte estava ligado com este fato. Era uma questão do sangue, uma questão de vida e morte, e o amor levou a isso, e essa foi a natureza do Seu relacionamento para com o Seu Pai.

Há duas coisas lá, amado, a serem observadas. Uma, a importância de um ouvido neste assunto. Por que não poderia ter sido outra coisa? Por que não primeiramente nos deixar dar a mão? Quando nós fazemos um pacto, dizemos que vamos dar a nossa mão. Por que não outro membro ou alguma outra instrumentalidade, por que o ouvido deve ser a coisa básica nisto? Bem, a resposta acho que é obvia. Porque você nunca pode fazer alguma coisa com a mão, porque você nunca pode expressar seu serviço por qualquer outro meio até que você tenha chegado a uma apreensão inteligente do que está no coração daquele a quem você está dando seu serviço, cujo servo você é. Esse obrar da mão é dependente do conhecimento da vontade dele, e este ouvido entrando na evidencia nesta conexão, está simplesmente dizendo isto – para sempre, voluntariamente, totalmente, na base do laço mais forte possível, a base do amor, não tenho um ouvido para ninguém mais além, meu ouvido como a porta de entrada da inteligência é seu.

Você vê, este ouvido entediado, amado, fica bem sobre esse freelance, anarquia do homem Adão que se rendeu a Satanás. Foi a anarquia do ouvido em Adão que trouce a confusão, e quando você toma a sovela e passa ela pela orelha, a orelha fica selada no sangue para outro, e é o tomar de volta este ouvido da esfera da anarquia que ocasionou toda a ruína e todo seu poder para fazer sua obra, tomando-o de volta completamente e totalmente, e colocando-o na mão de Deus para que as obras do diabo nunca mais tenham uma chance ao longo dessa linha; a partir desse momento o ouvido é o ouvido de Deus.

Agora, é claro, entendemos que não estamos só falando sobre ouvido físico, embora isso esteja incluso. O crente deve ter cuidado acerca do que o ouvido está ouvindo. É só na forma normal de todos os dias com o ouvido físico, que o diabo obtém muitas vantagens. A fofoca que conversamos, os rumores e relatos que, neles mesmos estão muitas vezes errados e distorcidos pelas pessoas que os espalham, crendo que são muito verdadeiros, e cremos serem a verdade, quando a coisa inteira é peneirada, resta pouquíssima verdade ao todo, e a questão toda tem estado errada. A Palavra de Deus nos diz “vede, pois, como ouvis”.

No sentido físico, é verdade que nosso homem interior é afetado pelo nosso ouvido exterior, mas não estamos falando apenas disso, tão importante como é para nós salvaguardar nossos ouvidos, o serviço real do Senhor não é só essa esfera física, está nesse ouvido interior mais profundo que está aberto para o Senhor e que é do Senhor. Quero dizer que ao Senhor lhe é dado o Seu lugar na vida interior para ser permitido falar, e outras coisas estão sendo caladas para que o Senhor fale; e isso é algo que é básico para o serviço sacerdotal.

O homem ou mulher que não tem um ouvido interior, nem um silencio interior, nem um lugar interior para ouvir o Senhor, nunca vai ser de muito uso no serviço do Senhor, e note bem, deve ser o Senhor, e nós devemos ter muito cuidado em dar mesmo até a homens e escritores bons o lugar que o Senhor deve ter.

Há um tempo em que devemos deixar nossos livros de lado, em que devemos nos apartar das vozes dos homens, em que devemos ficar calmos com o Senhor e escutar, e ainda mais, devemos procurar cultivar, pela graça de Deus, o ouvido que está sempre aberto para o Senhor mesmo quando todos os outros sons estão à nossa volta. É difícil, contudo não impossível, no furor da rua e correria da vida de trabalho o Senhor dizer alguma coisa; mas Ele apenas falará a aqueles que reconhecem o valor de escutar o Senhor e estão dando a Ele o Seu lugar de silencio para falar sempre que possível. O ouvido para ouvir o Senhor quando todos os outros sons e vozes estão à nossa volta está preparado e treinado nestes tempos de distanciamento que o Senhor demanda, e contra o que o diabo está eternamente ativo, para capturar o ouvido novamente.

Agora, isso é elementário (nós não estamos procurando ser profundos), mas tremendamente importante. Você e eu, pouco nos importamos de quão maduros espiritualmente somos – o único objetivo do diabo é capturar nosso ouvido de Deus, fazer impossível para nós ter a hora de silencio e o ouvido silencioso para Deus. O pressionar, e todas as coisas que acontecem justamente quando você decide ter um pouco de tempo calmo; é quando você tem que lutar pelo ouvido – você sabe que é verdade. Observe, existe algo ligado com isso; o desfazer das obras do diabo, a registração da mente de Deus sobre este universo, tudo que é tencionado pelo ministério sacerdotal, que está trazendo Deus, está ligado com isto: Deus tendo o ouvido.

Há duas coisas a serem notadas, esta é uma. A outra é esta: com este servo hebreu foi uma crise. Chegou o dia em que ele tomou uma decisão, o assunto alcançou um ponto de decisão e essa decisão envolveu ele por todo o tempo. Uma crise. A decisão voluntária. Agora, amado, o ponto é este. Temos que chegar, seremos compelidos a chegar, ao lugar onde decidimos de uma vez por todas se vamos servir ao Senhor sob compulsão, sob um senso de legalidade, sob um senso de obrigação, sob algum senso de consciência e continuar dia trás dia e ano trás ano, todavia, se pudêssemos apenas nos isentar, se apenas não tivesse de ser assim; gemendo sob isso, gemendo no serviço do Senhor. Temos que decidir se vai ser porque devemos, ou se vai ser nosso deleite fazer a Sua vontade, nossa alegria. Isso é uma crise, e esta crise representa a posição de apreciação do Amo para a qual temos que vir. Somos escravos num tipo de sentido legal consciencioso, de que tememos fazer o contrário, de que devemos fazê-lo, somos compelidos a fazê-lo por varias razões, seria algo desastroso sair e desistir. Seja esse o espírito ou seja “eu amo meu senhor, não sairei livre”, representa um ponto de nossa estimação do Senhor, nossa apreciação do Senhor, nosso senso de dívida ao Senhor, nosso reconhecimento do valor do Senhor; e, amado, o serviço que o Senhor está procurando não é um serviço no qual temos que ser forçados a fazer, o serviço que não irá render a menos que sejamos invitados a fazê-lo, o serviço que não é espontâneo mas que é organizado, e a menos que não nos for pedido assumi-lo não o faremos.

Oh, que tenhamos uma melhor ideia do que o serviço do Senhor é, mais do que plataformas e púlpitos e reuniões ao ar livre. Amado, o serviço para o Senhor é tão importante quando se está prestando algum ato bondoso de serviço útil para bem um filho de Deus depressivo nas coisas domésticas comuns da vida diária; quanto é valioso subir à plataforma e dar uma mensagem. É fortalecer as mãos dos filhos do Senhor, é vir à verificação do esmagar preponderante do adversário, vindo juntamente a levantar o testemunho numa vida ou casa onde o inimigo está tentando esmagar o testemunho – e o testemunho é algo mantido nos relacionamentos domésticos, na vida familiar, vida privada. Existem muitos que querem desistir dos seus serviços domésticos e ir para a Escola Bíblica, falhando em reconhecer que esse serviço aí pode ser tão valioso para o Senhor como o sair para o campo missionário. É espiritual, não técnico, não organizado, e você pode ser tanto um sacerdote do Senhor ao ir para alguma casa amanha onde o inimigo está pressionando, e dar uma mão prática ajudando a lavar os pratos, quanto você pode ser um sacerdote em pé na plataforma. Revisemos nossas ideias do Senhor. Não sempre, mas muitas vezes talvez para a majoria é o contrário, pois mais são chamados para cumprir ministério sacerdotal nessa esfera do que nesta esfera. Não o negligencie. Que seja a espontaneidade do amor pelo Senhor, não a compulsão ou senso de obrigação, não meramente por causa da consciência, pois quando o coração está corretamente relacionado ao Senhor, estas coisas tornam-se espontâneas. Não são forçadas, elas simplesmente fluem. Encontre a pessoa que tenha mais o amor de Deus no seu coração, essa pessoa está mais interessada pelos outros filhos de Deus.

Existem muitos sacerdotes de Deus cujas vozes nunca têm sido ouvidas em público, que nunca têm sido vistas numa forma pública, que são desconhecidos, escondidos muitas vezes na assembleia e mesmo na história secreta, cumprindo o mais valioso ministério. Ajuste-se perante isto. Temos que chegar ao ponto onde deliberadamente decidimos quanto a se o Senhor é digno disto, e abandonarmos a isto por causa de nossa apreciação Dele, o Amo. Observe, este servo abandonou-se a si mesmo livremente, voluntariamente, por todo o tempo para o serviço do seu senhor porque ele veio a amar seu senhor.


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