por T. Austin-Sparks
Capítulo 1 - O Que é o Ministério Profético
Ler: Deuteronômio 18:15,18; Atos 3:22; 7:37; Lucas 24:19; Apocalipse 19:10; Efésios 4:8,11-13
"Ele deu uns para... profetas... querendo o aperfeiçoamento dos santos, para a obra do ministério, para a edificação do Corpo de Cristo" (Efésios 4:11,12)
Vamos considerar a questão do ministério profético. "Ele deu uns para... profetas". Mas primeiro devemos fazer uma distinção, pois quando falamos de ministério profético, descobrimos que as pessoas são bastante influenciadas por uma mentalidade associada ao que é chamado de 'profecia'. Elas imediatamente relacionam o próprio termo 'profético' a incidentes, acontecimentos, datas, e assim por diante, que repousa principalmente no futuro. Isto é, elas pensam instantaneamente no elemento preditivo do ministério profético e limitam toda a função a esta concepção.
Agora, para o real valor daquilo que está diante de nós, devemos remover de nossas mentes esta idéia limitada de preeminência do aspecto preditivo no ministério profético. Ele é um aspecto, mas apenas um aspecto. Ministério profético é algo muito mais abrangente do que predição.
Talvez fosse melhor se disséssemos que a função profética, indo mais longe do que meros eventos, acontecimentos e datas, é o ministério da interpretação espiritual. Esta frase irá abranger todo o terreno daquilo com que estamos agora ocupados. Profecia é interpretação espiritual. Se você pensar nisto por um instante, considerando o ministério profético na Palavra de Deus, estou certo de que você irá ver quão verdadeiro isto é. É a interpretação de todas as coisas do ponto de vista espiritual; é trazer os significados espirituais das coisas - do passado, do presente e do futuro - para o povo de Deus, dando a compreensão do significado das coisas em seu valor e sentido espiritual. Este era e é a essência do ministério profético.
Naturalmente, aquilo que sabemos sobre profetas nas Escrituras é que eles exerciam uma função ou faculdade especial entre o povo do Senhor, mas também devemos lembrar de que eles freqüentemente combinavam suas funções proféticas com outras funções. Samuel era um profeta, mas também era juiz, e sacerdote. Moisés era um profeta, mas era outras coisas, além disso. Creio que Paulo era um profeta; ele era profeta, evangelista; ele era tudo, parece-me! Assim, nosso propósito não é o de falar de profetas, como pessoas distintas, mas de um ministério profético. É no ministério que estamos interessados, e iremos chegar ao instrumento reconhecendo o ministério desempenhado; compreenderemos melhor o vaso e veremos o que ele é se enxergarmos a finalidade para a qual ele foi constituído. Assim, deixe-me dizer que é a função, e não as pessoas, que temos em vista quando falamos de profetas ou ministério profético.
Estou bem certo de que aqueles que têm algum conhecimento, qualquer que seja, dos tempos, espiritualmente falando, irão concordar comigo quando digo que a necessidade premente do nosso tempo é a de um ministério profético. Nunca houve um tempo quando existisse tão extensivamente a necessidade de uma voz de interpretação, quando as condições necessitassem mais do ministério de interpretação. Ninguém quer fazer declarações extravagantes ou ser extremo em seus próprios discursos, mas eu acho que não seria nem extravagante nem extremo dizer que o mundo hoje está bastante carente de um verdadeiro ministério profético no seguinte sentido - uma voz que interprete a mente de Deus para as pessoas. Este ministério pode existir em algum pequeno grau aqui e ali, mas de modo algum está ele sendo cumprido de forma plena. Constantemente nossos corações gemem e clamam, Oh, que o propósito de Deus a respeito da presente situação possa ser recuperado, primeiramente para o reconhecimento de Seu povo, e, então, através de Seu povo para as pessoas mais distantes! Há uma grande e terrível necessidade de um ministério profético em nosso tempo.
Ministério Profético em Relação ao Pleno Propósito de Deus
Reconhecendo isto, precisamos chegar a entender que função é esta. Qual é a função do ministério profético? É a de levar as coisas para o pleno propósito de Deus, e por isso trata-se de algo reacionário. Geralmente achamos que os profetas surgem como uma reação da parte de Deus devida ao curso e tendência das coisas entre o Seu povo; uma chamada de volta, uma re-declaração, um re-pronunciamento do propósito de Deus, um trazer os pensamentos de Deus novamente à vista. Os profetas ficavam no meio da correnteza (normalmente uma correnteza rápida e impetuosa) como uma rocha; o curso das coisas se precipitava sobre eles. Eles desafiavam e resistiam aquele curso, e a presença deles no meio da correnteza representava a mente de Deus como que contrária ao curso predominante das coisas. No Velho Testamento, o profeta usualmente entrava em seu ministério num tempo quando as coisas estavam mal espiritualmente, elas eram tudo, menos a vontade de Deus; a situação era de miséria, as coisas estavam confusas, misturadas, caóticas; havia muita decepção, falsidade, e dificilmente as coisas poderiam piorar mais. Aqui está aquilo a que o ministério profético abrangente se refere - o original e supremo propósito de Deus para o Seu povo, e através dele; e ao dizer isto, você chega exatamente ao âmago da questão. Perguntamos novamente: O que é o ministério profético? Qual é a função profética? A que ela se relaciona? - E a resposta abrangente é que ela se refere ao pleno, original e supremo propósito de Deus para o Seu povo e através dele.
Se esta afirmação é verdadeira, ela nos ajuda a enxergar primeiramente a necessidade em nossa época; pois, falando genericamente, o povo de Deus na terra em nosso tempo tem confundido partes do propósito de Deus com o todo; têm enfatizado fases em detrimento do todo. Estão misturando os meios, os métodos, o entusiasmo e o zelo com o exato propósito do Senhor, falhando em reconhecer que o propósito de Deus deve ser alcançado à maneira de Deus e pelos meios de Deus, e, tanto a maneira quanto os meios são exatamente tão importantes quanto o próprio propósito: isto é, você não pode alcançar o propósito de Deus de qualquer maneira, por meio de qualquer tipo de método que você possa empregar, projetando suas próprias idéias ou programas, ou esquemas, para obter o propósito de Deus. Deus possui o Seu próprio método e meios de alcançar Seu objetivo. Os pensamentos de Deus se estendem e se espalham ao menor detalhe de Seu propósito, e você não pode entender completamente o propósito de Deus a menos que todos os detalhes estejam em conformidade com a mente de Deus.
Deus poderia ter dito a Moisés: "Construa um tabernáculo para Mim. Deixo com você o modo de fazê-lo, o material a ser usado; você sabe o que eu quero; vá e faça um tabernáculo para Mim". Moisés poderia ter a idéia do que Deus queria e ter planejado o tipo de coisa que ele faria para Deus de acordo com sua própria vontade. Mas sabemos que Deus não entregou nem um simples detalhe, um pino, um alfinete, um ponto de costura ou uma linha ao critério do homem. Eu apenas uso esta ilustração para inculcar o que estou querendo dizer, que o ministério profético serve para apresentar o pleno, original e supremo propósito de Deus; interpretar a mente de Deus em todas as questões concernentes ao Seu propósito, alinhar todos os detalhes ao propósito, e fazer o propósito governar todas as coisas.
Ministério Profético Pela Unção
(a) Conhecimento Detalhado dos Propósitos de Deus
Isto envolve várias coisas que são claramente vistas serem características do ministério profético na Palavra de Deus. Antes de tudo, envolve a questão da unção. O significado e valor da unção é que, primeiramente, somente o Espírito de Deus conhece o plano completo e detalhado, e só Ele pode fazer com que todas as coisas se ajustem em princípio à vontade de Deus.
Digo que somente o Espírito de Deus tem isto. Uma das coisas mais maravilhosas na Escritura é descobrir que, quando você se volta para a expressão mais simples, mais primitiva - digamos, a mais elementar - das coisas Divinas na Palavra de Deus, tudo lá está bem ajustado em princípio a tudo que surge mais adiante naquela mesma conexão em maior plenitude. É simplesmente maravilhoso como Deus tem mantido tudo ligado a um princípio: você jamais descobre mais tarde, não importa quão plenamente algo seja desenvolvido, que existe alguma mudança no princípio; o princípio está lá e você não consegue se desviar dele. Quando mais tarde você se ocupa com uma questão mais desenvolvida na Palavra de Deus, você descobre que ela está ligada ao seu princípio original, quando ela foi inicialmente apresentada. E Deus tem trazido todas as coisas alinhadas a esses princípios fixos. Deus não se desvia nem um milímetro. Sua lei está lá e ela é imutável. Somente o Espírito Santo conhece tudo isso. Ele conhece as leis e os princípios, todas as coisas que espiritualmente governam o propósito de Deus; e somente Ele conhece o plano e os detalhes, e pode fazer com que tudo se ajuste a esses princípios e leis. E tudo tem que se ajustar a eles. Podemos tomar isto como certo, se numa estrutura houver algo que esteja fora de harmonia com o princípio espiritual básico original, isto será uma falha que irá significar uma tragédia, mais cedo ou mais tarde. A estrutura, em cada detalhe de princípio, tem que estar ajustada à fundação, ao original. Muitos de nós não estamos iluminados quanto a tudo isto. Sentimos o nosso caminho ao longe, avançamos às apalpadelas, vamos recebendo luz lentamente, muito pouco de uma vez; mas recebemos luz. Porém o ministério profético é um ministério iluminado, e é isto que, debaixo da unção, significa trazer as coisas de volta à posição de absoluta proteção e segurança porque estão ajustadas ao princípio Divino.
A unção é necessária, primeiramente, porque somente o Espírito de Deus conhece todo o propósito de Deus e somente Ele pode falar, trabalhar e levar as coisas em harmonia e absoluta consistência aos princípios Divinos que governam tudo; e tudo que é da parte de Deus deve incorporar esses princípios. O princípio da Igreja - aquilo que governa a Igreja - é que ela é algo celestial. Ela não é uma coisa terrena; ela está associada a Cristo como estando no céu. A Igreja não veio à existência até que Cristo estivesse no céu, o que significa que a Igreja tem que ir, em relação a Cristo no céu, para o terreno celestial, de uma maneira espiritual. Ela tem que deixar a esfera terrena e realmente ser algo celestial, espiritual, embora ainda esteja aqui na terra. Esta é uma lei e um princípio Divino que é muito claro no Novo Testamento. Ela manifestadamente está lá, a partir de "Atos" em diante.
Mas isto não é uma coisa nova que chegou com o Novo Testamento. Deus colocou esta lei em tudo que aponta de alguma forma profética para a Igreja e para Cristo. Isaque não pôde deixar a terra e ir buscar sua esposa na terra estrangeira. Ele teve que permanecer lá e o servo é que foi enviado para trazê-la para onde ele estava. Aí está Sua lei. Cristo está no céu; o Espírito é enviado para levar a Igreja para onde Ele está - primeiramente numa forma espiritual, e, então, finalmente de forma literal; mas o princípio está aí. José passa pela rejeição e morte simbólica e finalmente alcança o trono, e com sua exaltação ele recebe sua esposa, Asenate. José é uma figura clara de Cristo. É em Sua exaltação que Cristo recebe Sua Igreja, Sua Noiva. O Pentecoste é realmente o resultado da exaltação de Cristo, quando a Igreja é espiritualmente levada para um relacionamento vivo com Ele mesmo, o Cristo exaltado. Aí está o Seu princípio na simples história de José. Você pode prosseguir desta maneira, vendo como Deus em detalhes simples tem mantido tudo ligado a um princípio; você descobre que Seus princípios eternos estão incorporados nas coisas mais simples do Velho Testamento, cumprindo esta declaração final que o testemunho de Jesus é o próprio espírito da profecia (Apocalipse 19:10). Há algo aí que indica uma grande verdade celestial, que é o espírito da profecia apontando para Cristo. Eu me pergunto se você realmente ficou impressionado com a tremenda importância do principio Divino nas coisas. Há um princípio, e o reconhecimento e o respeito deste princípio determina o sucesso do conjunto todo. Agora, somente o Espírito Santo conhece todos esses princípios Divinos, somente Ele conhece a mente de Deus, os pensamentos de Deus, em plenitude. Daí, se é para as coisas serem levadas ao pensamento e propósito pleno de Deus, isto somente será possível através da unção – o que significa que o Espírito de Deus veio para assumir o comando. Um ministério ungido significa que o Deus Espírito Santo se tornou responsável pela coisa toda; Ele está engajado nela, e eu não suponho que alguém iria discutir ou contestar a declaração da necessidade do Espírito Santo, a necessidade de que Ele esteja no comando, de que tudo seja feito por Ele. Mas, oh, isto significa muito mais do que uma verdade e uma posição geral.
(b) Conhecimento Transmitido por Revelação
Isto leva a uma segunda coisa no ministério profético: Pela unção vem a revelação. Podemos aceitar de forma geral a necessidade de o Espírito fazer tudo - iniciar, conduzir, governar e ser o poder e a inspiração de tudo; mas oh! Isto é uma instrução para uma vida toda, e isto traz a necessidade de que tudo seja dado por revelação. Este é o porquê de originalmente os profetas serem chamados de 'videntes' - homens que viam. Eles enxergavam o que nenhum outro homem enxergava. Eles viam aquilo que era impossível às outras pessoas verem, mesmo os religiosos, pessoas que temiam a Deus. Os profetas viam por revelação.
Um ministério profético requer revelação; é um ministério de revelação. Mais adiante iremos examinar isto mais de perto, mas quero apenas enfatizar o fato neste momento. Não estou pensando em revelação extra Escritura. Não posso tomar o terreno de certos 'profetas'(?) na Igreja hoje que profetizam fora das Escrituras. Não, mas dentro da revelação já dada - e Deus sabe que ela é grande o suficiente! - o Espírito Santo ainda se move para revelar aquilo que 'nenhum olho viu, nem ouvido ouviu'. Esta é a maravilha de uma vida no Espírito. É uma vida de constante nova descoberta; tudo está cheio de surpresa e maravilha. Uma vida guiada pelo Espírito jamais pode ser estática; jamais pode alcançar o fim aqui, nem chegar a uma posição onde a soma da verdade esteja encaixotada. Uma vida realmente no Espírito Santo é uma vida que percebe infinitamente, transcendentemente, mais além do que aquilo que temos visto, ou captados, ou sentidos. As pessoas que chegaram a uma posição fixa e não conseguem enxergar - quem dirá se mover - além de sua própria posição atual, representam uma posição que é estranha à mente do Espírito Santo. Ministério profético sujeito ao Espírito Santo é um ministério de revelação crescente.
O profeta era um homem que sempre recorria a Deus, e não saía para falar até que Deus lhe mostrasse a próxima coisa. Ele não ia simplesmente em seu ofício profissional, porque era um profeta e isto era esperado dele. Não havia nada de professional sobre sua posição. Quando a coisa se tornou profissional, então a tragédia tomou conta do oficio profético. Ele se tornou profissional a partir das 'escolas dos profetas’ estabelecidas por Samuel. Não devemos confundir essas escolas dos profetas com o verdadeiro oficio profético. Havia uma diferença entre aqueles que se graduavam nas escolas dos profetas e os verdadeiros profetas representados por homens tais como Samuel, Elias, Eliseu. Sempre que as coisas se tornavam profissional, algo era perdido, porque a própria essência e natureza do ministério profético é aquilo que vem por revelação fresca a todo tempo. Uma coisa revelada é nova; ela pode ser algo velho, mas há algo sobre ela que é fresco como uma revelação ao coração da pessoa em questão, e é tão novo e maravilhoso que o efeito com esta pessoa é como se ninguém jamais tivesse visto aquilo, embora milhares possam tê-lo visto antes. Faz parte da natureza da revelação manter as coisas vivas e frescas, enchendo-as de energia Divina. Você não pode recuperar uma posição antiga apenas com doutrina velha. Você jamais irá recuperar algo de Deus que se perdeu trazendo de volta a exata declaração da verdade. Você pode declarar com exatidão a verdade dos primeiros dias do Novo Testamento, mas pode estar longe de ter as condições obtidas em tais tempos.
Sucessão profética não é sucessão de ensino; é uma sucessão de unção. Algo pode vir de Deus, pela operação de Deus; pode haver algo muito real, muito vivo, que Deus efetiva através de uma instrumentalidade, pode ser individual ou coletivo, o qual é vivo devido Deus tê-lo trazido debaixo de Sua unção. E, então, alguém tenta imitá-lo, duplicá-lo, ou mais tarde alguém o assume para executá-lo; alguém foi apontado, eleito, escolhido por meio de voto para ser o sucessor. A coisa segue e cresce; porém algum fator vital não mais estará lá. A sucessão é por meio da unção, não por meio de uma estrutura, nem mesmo de doutrina. Não podemos recuperar as condições do Novo Testamento por meio de re-afirmar a doutrina do Novo Testamento. Temos que receber a unção que tornam as coisas vivas, frescas, vibrantes. Tudo tem que vir por meio de revelação.
Alguns de nós sabemos o que é ser capaz de analisar nossas Bíblias e apresentar, talvez de maneira muito interessante, os conteúdos de seus livros e todas as suas doutrinas. Podemos fazer isto com 'Efésios' tão bem como podemos fazê-lo com qualquer outro livro. Podemos chegar em 'Efésios' e analisá-lo e delinear a Igreja e o Corpo e tudo mais, e sermos tão cegos quanto morcegos até que o dia chega, aí então, havendo Deus feito algo dentro de nós (algo profundo, maravilhoso e tremendo), enxergamos a Igreja, o Corpo - enxergamos "Efésios"! Eles eram dois mundos: um era verdadeiro, exato em detalhe técnico, cheio de interesses e fascinação - mas havia algo faltando. Podíamos ter declarado a verdade do princípio ao fim, mas não conhecíamos aquilo que estava nela; e até que tenhamos passado por essa experiência e algo tenha acontecido em nós, podemos achar que sabemos, podemos dar nossa vida por aquilo; mas de fato não conhecemos. Há muita diferença entre uma compreensão perspicaz, clara, mental das coisas na Palavra de Deus, e uma revelação espiritual. É uma diferença entre dois mundos - e é impossível fazer com que as pessoa entendam esta diferença até que algo aconteça. Iremos falar sobre este 'algo que acontece' mais adiante, porém aqui estamos apenas afirmando os fatos. Pela unção há revelação, e revelação pela unção é essencial para se enxergar aquilo que Deus procura, tanto no geral como no detalhe.
Assim, desenvolvendo, chegamos ao seguinte: ministério profético é aquele ministério que - embora muito detalhe ainda tenha que ser revelado, até mesmo aos mais iluminados servos de Deus - é aquele que tem, pelo Espírito de Deus, enxergado o propósito de Deus, de forma original e final.
(c) Conformidade Exata aos Pensamentos de Deus
E, então, uma terceira coisa que descobrimos associada à unção. É aquilo a que já nos referimos no geral - exatidão.
A unção traz em primeira mão aquele contato com Deus, o que significa ver Deus face a face. Não foi isto que resumiu a vida de Moisés? "Nunca mais se levantou nas terras de Israel um profeta semelhante a Moisés, com quem o Senhor falava face a face" (Deut. 34:10). E quando isto acontece você chega a uma posição de conhecimento espiritual direto de Deus, contato direto com Deus, você chega ao lugar onde céu está aberto - você não pode, sob nenhuma hipótese, por alguma vantagem, ser uma pessoa que faça transigências, que se desvia daquilo que tem sido mostrado ao seu coração.
O que é isto que o apóstolo diz a respeito de Moisés? "Moisés se achou fiel em toda a sua casa, como servo" (Heb 3:5); e a fidelidade de Moisés é vista particularmente e em grande medida na maneira como ele foi dominado exatamente por aquilo que Deus disse. Você conhece aqueles últimos capítulos do livro de Êxodo, trazendo tudo de volta para a palavra, sempre, "como o Senhor havia ordenado a Moisés". Tudo era feito como Deus falava; através de todo o sistema a que Moisés foi levantado para estabelecer e constituir, ele era fiel ao detalhe. Sabemos por que, naturalmente; e aqui está aquela grande e abrangente explicação do que acabei de dizer sobre os princípios. Deus tem Cristo em vista o tempo todo, e cada detalhe, e aquele sistema que Moisés instituiu era uma representação de Cristo; e, assim, era necessário que aquilo fosse exato em cada detalhe. É uma dificuldade, um caminho custoso, mas você não pode ter revelação, e avançar em revelação, e ao mesmo tempo negociar sobre os detalhes e ter as coisas em cada ponto diferente daquilo que exatamente o Senhor quer. Você não é governado por diplomacia, política, ou opinião pública. Você é governado por aquilo que o Senhor disse em seu coração pela revelação quanto ao Seu propósito. Isto é ministério profético.
Os Profetas não eram homens que se acomodavam a alguma coisa que fosse comparativo em sua bondade. Eles jamais se permitiam avançar completamente se a coisa fosse apenas comparativamente boa. Olhe para Jeremias. Houve um dia na vida de Jeremias quando um bom rei buscava recuperar as coisas, e ele de fato deu uma grande festa na Páscoa, e foi aparentemente uma grande ocasião. Eles estavam fazendo grandes coisas lá em Jerusalém, mas com tudo aquilo que acontecendo de bom, confessadamente bom, Jeremias não se deixou levar. Ele tinha uma reserva, e ele estava certo. Foi visto mais tarde que tudo não passava de algo muito superficial, que o coração do povo não havia mudado, os lugares altos não foram removidos, e a profecia original de Jeremias tinha que permanecer. Se a reforma aparente tivesse sido algo verdadeiro, então as profecias de Jeremias sobre o cativeiro, a destruição da cidade, a completa entrega ao julgamento, teria resultado em nada. Jeremias se conteve. Ele pode não ter entendido, pode ter ficado perplexo a respeito, mas o seu coração não lhe permitia que se deixasse levar por aquele algo comparativamente bom. Ele descobriu a razão do porque mais tarde - que, embora fosse surpreendentemente bom em certo aspecto, não representava uma mudança de coração, e, portanto, o julgamento tinha que vir.
O profeta não pode aceitar como suficiente e final aquilo que é apenas comparativo, embora ele se alegre na medida do benefício que possa haver em alguma parte. Devemos, naturalmente, ser generosos para com qualquer pouco de bem que está no mundo - vamos ser gratos por tudo está correto, que é verdadeiro e de Deus; mas oh! Não podemos dizer que aquilo está satisfazendo plenamente ao Senhor, que é tudo o que o Senhor deseja. Não, o ministério profético é completamente fiel aos pensamentos de Deus. É um ministério de exatidão. É isto o que a unção significa, e nós dissemos por que - é um Cristo pleno que se está em vista.
A última declaração em Apocalipse 19:10 resume tudo. Ela sintetiza numa sentença o ministério profético desde o princípio. Suponho que o ministério profético começou no dia quando foi declarado sobre a semente da mulher que iria esmagar a cabeça da serpente, e então passou para Enoque, que profetizou dizendo: "Olhem, o Senhor virá..." (Judas 14), e foi assim a partir de então. Está tudo reunido no final de Apocalipse no seguinte pensamento: que "o testemunho de Jesus é o espírito da profecia". Isto é, o espírito da profecia desde o início até o fim está totalmente voltado para isto - o testemunho de Jesus. O espírito da profecia sempre teve Jesus em vista desde o seu primeiro pronunciamento - "a semente da mulher" - até "Olhem, o Senhor virá..." (e como o princípio e o fim são trazidos juntos desde tão cedo!) Durante todo o caminho foi sempre com o Senhor Jesus em vista, e um Cristo pleno. "Ele deu profetas... até que todos cheguemos...à plenitude de Cristo". Este é o objetivo, e Deus jamais pode ficar satisfeito com qualquer coisa a não ser a plenitude de Seu Filho, representado pela Igreja. A Igreja deve ser a plenitude Dele; um Varão perfeito - esta é a Igreja. O ministério profético é para isto - para a plenitude de Cristo, a total inclusividade de Cristo. É para ser Cristo, o centro da circunferência; Cristo, primeiro e último; Cristo no geral e Cristo em cada detalhe. E ver Cristo por revelação significa que você jamais pode aceitar qualquer coisa diferente disso. Você viu, e isto tem estabelecido. A maneira de se alcançar o objetivo de Deus, então, é enxergando por meio do Espírito Santo, e este enxergar é a base do ministério profético.
Acho que isto é suficiente para mostrar o que dissemos no início, que, se enxergarmos a natureza do ministério, imediatamente enxergamos o que o vaso é. O vaso pode ser indivíduos cumprindo tal ministério, ou pode ser um coletivo. Mais adiante poderemos falar algo mais sobre o vaso, mas vamos agora pensar tecnicamente, em termos de apóstolos, profetas e outros, como ofícios. Vamos pensar sobre eles como funções vitais. Deus quer que o homem e a função sejam idênticos, não o homem e um profissional, ou uma posição profissional, seja que título for. O vaso deve ser a função, e a função deve justificar o vaso. Nós não vamos andar por aí nos promovendo como profetas; mas Deus conceda que possa ser levantado um ministério profético para um tempo como este, quando o Seu pleno propósito concernente a Seu Filho seja trazido de volta à vista entre o Seu povo. Esta é a necessidade das pessoas, e também Dele.
Em consonância com o desejo de T. Austin-Sparks de que aquilo que foi recebido de graça seja dado de graça, seus escritos não possuem copirraite. Portanto, você está livre para usá-los como desejar. Contudo, nós solicitamos que, se você desejar compartilhar escritos deste site com outros, por favor ofereça-os livremente - livres de mudanças, livres de custos e livres de direitos autorais.